akiSintaSaúde

que sustenta a vida, é dos alimentos que a força, a beleza e a vitalidade dependem.” Susruta-Samhita 1/28

O ser humano é um ser único na sua natureza e complexidade. Tecidos, órgãos e ossos em constante interacção com o mundo exterior devido à existência de um “tubo oco” – o intestino, que permite ao Homem ser uno com o cosmos. Pois tudo quanto está representado no cosmos tem expressão no Homem devido à existência dos cinco elementos que, quando combinados nas proporções certas, dão origem a todas as estruturas, comportamentos, sentidos, necessidades e prazeres do Homem.

A Medicina Ayurveda tem como primeiro e principal objectivo a preservação da saúde da população. Esta possui o seu próprio sistema de anatomia e fisiologia dividido em três qualidades vitais – doshas, em sânscrito. Estes agrupam os cinco elementos da natureza dois a dois e são o seu pilar de estudo e diagnóstico:
– Pitta (Fogo e Água): responsável pelo catabolismo do organismo – processo de transformação dos alimentos em energia para ser utilizada no processo de anabolismo; – Kapha (Terra e Água): regente do anabolismo do organismo – processo que utiliza a energia gerada pelo catabolismo para fazer crescer e reparar os tecidos; – Vata (Éter e Ar): é o mecanismo de equilíbrio de todo o corpo pois controla Pitta e Kapha e previne que estes se tornem negativos.

O elemento fogo desintegra o que é complexo e torna-o simples. Assim, no organismo humano, este elemento é responsável por todos os processos metabólicos, incluindo a digestão. Cada dosha possui qualidades e atributos próprios que são pilares da constituição básica do indivíduo e que caracterizam também o seu fogo digestivo (agni): Vata possui um fogo digestivo inconstante que se traduz numa digestão irregular, o fogo digestivo de Pitta é intenso e como tal a sua digestão torna-se rápida e pontual, Kapha tem um fogo digestivo lento, o que torna a sua digestão lenta. Uma digestão óptima só é possível com os doshas equilibrados. O agni é essencial para a sobrevivência do indivíduo pois se por um qualquer motivo não está bem, traz consigo desequilíbrios e doenças, podendo mesmo desaparecer e levar o indivíduo à morte, mas se está óptimo produz felicidade e uma vida longa.

O elemento fogo existe no nosso corpo na mesma quantidade que o elemento água. Esta é necessária em todos os organismos vivos para conferir sabor à vida. Sem a existência da água na cavidade bocal, os alimentos parecem-se com areia em papel. É a água que permite a descodificação dos alimentos e que, através do sistema nervoso, cria os seus sabores. Os sabores têm um complexo potencial terapêutico devido às energias que contêm, podendo equilibrar, agravar ou reduzir os doshas. São eles as assinaturas ou marcas dos elementos. Na medicina Ayurveda, ao sabor chama-se Rasa: existem seis e cada um deles manifesta a presença de dois elementos. No entanto, a análise dos sabores não se fica apenas pelo percepcionado na boca. Existem os efeitos digestivo e pós-digestivo. Ao primeiro chama-se Virya e diz respeito à energia quente ou fria que caracteriza os alimentos. Ao segundo chama-se Vipak e diz respeito às propriedades e qualidades que o alimento tem após ser digerido pelo organismo.

Sabor/RasaElementosViryaVipakAgravaDiminui
DoceTerra+ÁguaFrioDoceKaphaVata/Pitta
ÁcidoTerra+FogoQuenteÁcidoKapha/PittaVata
SalgadoÁgua+FogoQuenteDoceKapha/PittaVata
PicanteAr+FogoQuentePicanteVata/PittaKapha
AmargoAr+ÉterFrioPicanteVataKapha/Pitta
AdstringenteAr+TerraFrioPicanteVataKapha/Pitta

  Os doshas coordenam o poder digestivo, a natureza do intestino, bem como o ciclo da vida e podem estar equilibrados ou em desequilíbrio por excesso ou por necessidade. Alimentos, plantas, sementes ou remédios são agrupados consoante o seu efeito nos doshas, tal como doenças e patologias são descritas nesta mesma perspectiva. Mais do que a caracterização do corpo e das digestões, os doshas caracterizam as fases da vida de um indivíduo, as hora do dia e tudo quanto o rodeia:  

DoshaFases de VidaDigestãoHoras do Dia
KaphaCriançaInício6h/10h e 18h/22h
PittaJovem e AdultoProcesso (meio)10h/14h e 22h/2h
VataVelhiceQuase no fim14h/18h e 2h/6h

  A alimentação é a principal fonte de energia e nutrição para qualquer organismo vivo, sendo, de certa forma, o que se ingere indutor do comportamento. Esta não são potencia energia e nutrientes como permite que sejamos saudáveis, que possamos crescer e amadurecer. No entanto, nem todos os alimentos são bons ou maus. A qualidade do que comemos diz respeito não só à qualidade do alimento, mas também ao processo de confecção, à pessoa que o confeccionou, ao modo como o vamos ingerir tal como ao local e à hora, ao nosso dosha de constituição básica (prakriti), ao que o desequilibra ou trouxe a doença (vikriti), entre muitos outros factores. Assim, o que é bom para determinada pessoa pode não ser bom para outra.
Na medicina Ayurveda, o equilíbrio é o mais importante e o horário essencial. Mas o conceito de horário possui algumas diferenças, nomeadamente porque tem que ver que os ritmos biológicos de cada indivíduo – a hora certa para comer é quando se tem fome pois esta só surge quando a primeira digestão se encontra completa.

A questão tantas vezes levantada pelo ocidente em relação à alimentação e às suas proporções é respondida pela medicina Ayurveda de forma muito simples: a quantidade de comida no prato depende da capacidade digestiva do indivíduo. Em quantidades erradas qualquer alimento afecta a digestão e torna-se menos saudável, mesmo sendo muito bom.
Existem comidas pesadas e comidas leves. As proporções em que são ingeridas vão influenciar a digestão de tal forma que até uma comida leve ingerida em excesso pode tornar-se pesada e levar à formação de toxinas – ama – que vicia os doshas, causando inúmeras doenças e desequilíbrios.
Para uma refeição sólida deve ingerir-se ½ da capacidade do estômago, e para uma refeição líquida apenas ¼. Astanga-Hrdaya, um antigo e popular texto acerca dos costumes da cultura Ayurveda, engloba todas as práticas relacionadas com os alimentos e com o momento da refeição.